Lá se foi mais um cansativo dia de trabalho e Júlia já se encontrava dentro do metrô, feliz por ir embora. Em determinada estação, entrou João, um moço sofrido e convincente em pedir esmolas. Júlia que nunca acreditou em histórias contadas por pedintes, não pôde deixar de reparar no rapaz, que possuía agonia e tristeza entranhadas em sua fisionomia e voz.
João trazia alguns documentos em mãos, os quais erguiam pra que todos vissem como se fossem machucados em sua pele. Ele contou uma breve história em voz alta, sem se importar com a humilhação ou vergonha em revelar sua vida privada.
O rapaz narrou tristemente sua falta de sorte em vir para São Paulo, acompanhado de sua família, com uma falsa proposta de emprego. Estava prestes a ser despejado, mas tudo o que mais queria naquele momento, era arrecadar um pouco de dinheiro para poder jantar com sua família mais tarde.
A forma como João pronunciava as palavras, transmitia a todos sinceridade e um grande pesar por estar naquela situação, o rapaz foi tão comovente, que todos os presentes se calaram para ouvi-lo. Ele era pai de família, e sua esposa e filhos, o aguardavam fora da estação, enquanto ele tentava garantir o sustento daquela noite.
Durante sua narrativa, João fazia das suas finanças um livro aberto, revelando de forma lúdica o valor exato que já havia arrecadado, mostrando as notas em sua mão, para logo depois contabilizar o quanto ainda restava.
Haviam lágrimas nos olhos dele e tristeza em seu tom. Enquanto falava, pessoas o interceptavam em silêncio, lhe dando pequenas quantias, mas com grande satisfação em ajudar. Júlia que nunca cedeu a um pedido de esmola antes, queria poder ajudá-lo, mas estava desprevenida naquele dia.
Quando restava apenas R$10 para atingir seu objetivo, toda a plateia sentiu uma grande pressão. João anunciou choroso que faltava pouco, mas ninguém mais estendia a mão. Será que mais ninguém o ajudaria? Fez se aquele silêncio digno da pergunta final do show do milhão.
Apenas R$10! João repetia agoniado, deixando todos os que ouviam constrangidos pela falta do dinheiro. Até que de repente, um jovem rapaz lhe presenteou com uma nota R$20! Todos bateram palmas!
Coincidentemente, nesse momento chegou à estação em que Júlia desembarcaria. Na plataforma, chamou João e lhe disse que sentia muito e que queria muito ter conseguido ajudá-lo na “vaquinha”. João, tocado com a bondade da moça, disse que poderia ajudá-lo se lhe conseguisse um emprego de verdade, talvez onde ela trabalhasse, quem sabe. Júlia achou seu pedido um pouco ousado, não sabendo se seria prudente, indicar uma pessoa que na verdade não sabia nada, além de um discurso emotivo no metrô. De qualquer forma, ficou com seu contato e disse que veria o que poderia fazer.
Semanas, meses, ou até mesmo anos depois, Júlia se deparou novamente com João, naquela mesma situação, contando sua triste história de vida dentro do metrô, enquanto o transporte andava de estação a estação. Estupefata com a grande cara de pau do rapaz, não deixou que ele a visse, devido à grande vergonha que sentiu, por ter se deixado enganar por ele.
Seria mesmo João mentiroso? Um promissor a carreira de ator? Ou um azarado sofredor, que ainda não tinha conseguido se levantar, daquela possível tragédia que narrava??