O Falso Rico
Um dia conheci um cara. Estava num cruzeiro da MSC com a minha mãe e conheci um homem metido a milionário. Ele dizia ter a sua própria empresa, que era muito rico, que viajava bastante, isso quando a categoria que ele escolheu naquela viagem era inferior a minha. “Vim com uns amigos que não queriam gastar tanto, então por isso não estou na categoria Yatch Club”. Justificou ele. “Gente milionária tem amigos milionários”, pensei desconfiada.
Não que me importasse a sua condição financeira, o que me incomoda são pessoas mentirosas querendo passar uma imagem do que não são. Desde o início do nosso flerte, não senti nenhuma verdade nele. Sabe quando algo soa falso em determinada pessoa? Eu devo passar uma imagem de moça ingênua, mas mal sabia ele que a veia jornalística corre em mim, sou um tanto investigativa e possuo um feeling bem apurado em relação as pessoas que interajo.
Naquela primeira noite de cortejo, inventou uma história, do qual não me lembro agora, para tentar me levar até a sua suíte, mas me esquivei e voltei para os meus amigos na festa. – Fiz algumas amizades a bordo. –
No dia seguinte, ele tentou uma reaproximação e ao notar que tinha voltado a estaca zero, que eu me comportava friamente, como se todo o flerte da noite anterior não tivesse existido, ele perguntou o que estava acontecendo, o porquê de eu estar mais distante. Honesta como sou, não fiquei de meias palavras e expus a grande verdade dos fatos:
-Não senti sinceridade em nada do que você me falou ontem. Fiquei com a sensação de que tudo que você contou foi só para me impressionar.
Ele deu risada e sacou seu celular do bolso. Me mostrou uma foto sua dentro de um carro – que não adiantou nada, pois não sou grande entendedora de carros, ao ponto de identificar qual é só pela foto de um volante – dentro de uma garagem de um estacionamento, o que me deixou a dúvida se ele só não estava fazendo um test drive, rs.
Depois me contou qual o montante de dinheiro ele tinha aplicado e mais uma vez desconfiei da sua história. Rico que é rico não fica fazendo inventário do quem tem para uma pessoa que mal conhece. A não ser que seja um novo rico, o que, segundo ele, não era o seu caso. Ou seja, mais uma vez ele fracassou em me conquistar com toda a sua descrição de sucesso financeiro.
Enfim, terminou o Cruzeiro, voltamos para nossas respectivas casas em São Paulo – coincidentemente ele também mora aqui – e já no dia seguinte me enviou uma mensagem, sugerindo que saíssemos.
Eu estava zero animada para sair com ele, no entanto, estava legal alguém me cortejando com tanto empenho daquele jeito – coisa de ego – , acabei cedendo. Eu estava com planos de ir ao cinema naquela tarde, então falei que se ele quisesse poderia me encontrar lá. Ele aderiu. Fomos assistir à um filme chamado: “Lizzie”, por escolha minha – muito ruim, por sinal – ele pagou pelos ingressos e a pipoca. Trocamos alguns beijos durante a sessão.
Na hora de ir embora, me ofereceu uma carona e aceitei. Seu carro era nada mais, nada menos que uma Mercedes. Um carraço. Seu painel era um tablet gigante. Percebi que ele queria exibir seu carro para mim quando durante o trajeto até a minha casa, ele interagiu com o veículo: “Hi Mercedes!” E o carro o respondeu com outro cumprimento. “Sintoniza na 106.9”, ele ordenou na sequência – não me recordo se a estação de rádio escolhida foi essa mesmo, apenas um exemplo meramente ilustrativo – e o carro fez um efeito sonoro “blu blu” de que estava atendendo ao pedido e logo a rádio solicitada sintonizou, tocando música para nós.
Não tive como não reagir a tanta modernidade: “Nossa que chique!”, elogiei. E ele: “Oi?” Com a maior cara de sonso, como se o seu objetivo tivesse sido alcançado, visivelmente esnobando por eu ter demonstrado um mísero deslumbre pelo seu carro. “Oi, tudo bem?!” Respondi sem paciência, levemente debochada.
Daí ele me contou que aquele carro era o último modelo lançado pela Mercedes, que só tinham 40 modelos no Brasil – ou no mundo, detalhes que também não me recordo agora – e assim seguimos com a viagem, que não foi muito longa, pois eu morava perto do shopping Frei Caneca, cujo escolhido por nós.
Próximo de chegarmos na minha casa, já adiantei que não poderia chamá-lo para subir, pois estava naqueles dias, cortando as suas asinhas de que se daria bem com aquela carona. Ele respondeu algo como se não estivesse esperando por nenhum “algo mais”, contudo, cantou pneu quando estava indo embora, visivelmente chateado.
Dois dias depois me convidou para comer pizza no seu apartamento. Aceitei o convite. Ele chamou um Uber para mim e me recebeu lá. O apartamento era bonito, mas ao mesmo tempo nada demais. Notei que não havia nenhum porta retrato ou quadros nas paredes, ou seja, uma moradia sem nenhum toque pessoal. Quando precisei ir ao banheiro, notei um fio de cabelo vermelho na pia e Dermacyd dentro do Box. Suspeito. “Esse cara deve ser comprometido”, pensei desconfiada.
Enquanto eu comia a pizza, notei outras coisas estranhas no apartamento, como a tal Caneca do Hulk, que me inspirou a escrever o monólogo. Fiquei com uma forte sensação de que aquele apartamento não era dele. Mais tarde, investiguei pelo seu endereço, que aquele apartamento estava no nome de um casal e não em seu nome. Estranho um cara rico, como ele se dizia ser, morar num apartamento que estava no nome de outras pessoas, além de todas as outras esquisitices que pude notar durante o encontro. Pelo que investiguei, ele era corretor de imóveis e não empresário como se pintou para mim. Enfim, meu feeling nunca erra.
Ele me enviou mensagens nos dias seguintes e me esquivei com a desculpa da falta de tempo, o que não deixava de ser verdade, mas quando a gente quer, dá um jeito, o que não era o meu caso. Conforme ele continuava insistindo, inventei uma desculpa mais definitiva para que parasse de me importunar. Falei que tinha voltado com o meu ex e mesmo assim, de tempos em tempos, ele tentava a sorte, me procurando novamente, sendo sempre deixado no vácuo.
Quando voltei do seu apartamento, toda desconfiada e cheia de teorias conspiratórias, enviei um áudio contando da experiência para meus amigos e foi quando surgiu a ideia de transformar aqueles áudios em um monólogo, resultando então nesse trabalho engraçado e totalmente empírico!
P.S.: Manu me inspira!